Helô seguia, na verdade, pra seu apartamento, estava farta.
Farta de promessas, juras descartáveis, problemas... Bufa, tentando pôr para
fora de seu peito tudo aquilo, mas de nada adianta retirar o ar dos pulmões,
pois os sentimentos revirados estavam no coração. Ela dirige muda até seu
destino (Helô muda? Estranhe! Pois até sozinha ela costuma falar!!), entra em
casa e sente falta de ser recebida com carinho por sua fiel escudeira, Creusa.
Alguns momentos passam por sua mente, como quando se separou de Stenio ou
passou no concurso da PF, era sempre Creusa a primeira a ampará-la ou
parabenizá-la. Caminha até seu quarto, junto com o vazio que carregava no
peito.
Na praia, Stenio sente o mesmo vazio. Como pudera oscilar de
emoções tão rapidamente? Afinal, naquela tarde, ele sentira um extremo medo por
perder Helô no mar, logo uma imensa felicidade ao revê-la e imediatamente uma
infinita tristeza por magoa-la, mesmo sem motivos e/ou sem querer. Ele caminha
pelo calçadão, desolado, fritando sua cabeça, arrumando um modo de se redimir,
acalmá-la, fazê-la acreditar que o que tinha visto (Carmem e ele na areia) não
era o que ela imaginava. Passos largos o afastavam cada vez mais do ponto onde
ele havia brigado com sua amada e também o afastavam do mundo real. E assim ele
segue até o anoitecer.
No apartamento de Helô...
H: Maitê? – Ela falava no tablet.
M: Oi amiga, como você tá?Que cara tristinha é essa?
H: Não, nada. – Maitê
faz cara de desacreditada. – Eu já disse que não é nada, Maitê. – Briga - Se eu
disse que é nada, é nada. – Agora parecia chorosa.
M: Heloisa, eu te conheço, amiga. Fala logo o que tá
acontecendo!
H: Não não não nã...
Tá certo ta ta ta eu digo! – Respira fundo. – Stenio... Você pode passar aqui?
M: Own, meu amorzinho, não posso. – Fala carinhosamente. –
Tenho que ir buscar a Bi no aeroporto.
H: Bianca? Voltou? Veio pra ficar?
M: Sim sim. Você acredita que finalmente vamos abrir a loja?–
Helô sorri, mas logo desmancha o riso, preocupando a amiga. – Mas espera, fala
o que você tem primeiro, eu só vou buscá-la daqui à uns minutos. Quero saber...
E agora!!
H: Vou falar,
calma... - Helô explica toda a cena que assistira naquela tarde, também comenta
a manhã mágica que passaram juntos. Cada palavra doía em seu peito, fazendo-a
reviver todos aqueles segundos tão bons de seu dia.
M: Amiga, mas por que tanta angustia? Ele não te traiu. Pelo
que você acabou de me explicar, foi uma salva-vidas que tava SOCORRENDO ele – Enfatiza.
H: Mas Maitê, eu vi! Ele tava se insinuando pra cima
daquela... daquela... daquelazinha lá! – Vira o rosto, como uma criança de
birraça.
M: Heloisa. – Fala sério. – Heloisa, olha pra mim. – Pausa. –
Você tá com medo de novo, não é? – Ela bufa e revira os olhos, discordando. – E
não tenta disfarçar não! Eu te conheço, às vezes, melhor que você mesma!
H: Maitê...
M: Não vem com essa, amiga. Se você tá com medo, os
enfrente! Cadê aquela delegata durona que prende todo mundo?? Cadê? - Helô sorri com os olhos marejados - Cadê
aquela mulher forte que enfrentou toda uma máfia?? Hein? – Uma lágrima escapa e logo ela tenta esconde-la.
– Hello!? Sou eu, Maitê! Não precisa esconder nada de mim, pois sei muito bem
quem é você. Sei do seu passado, dona delegada... – Brinca.
H: Ai, Maitê, você é INACRÊ – sorri, limpando as outras
lágrimas que acabaram rolando por seu rosto. – Amiga, como eu queria você aqui
agora, queria teu colinho – Faz bico. – Eu to com medo sim! Triste e com medo.
M: Me diz, amorzinho, porque tristeza se você sabe que ele
te ama? Praticamente de idolatra!
H: Medo de sofrer tudo de novo. O Stenio é reincidente e
depois de hoje... – Abaixa a cabeça. – Ele me machucou, me magoou mesmo... –
Heloisa não chega a completar sua frase, pois é interrompida por Stenio, que
entrava no quarto.
O advogado entra de cabeça baixa, com o semblante abatido, a
olha, porém ela estava com o rosto virado para retardar esse encontro.
Arrasado, segue para o banho.
Enquanto Stenio banhava-se, Heloisa arrumava o quarto de
hóspede, com o intuito de fazê-lo dormir ali. Ela, perdida em seus pensamentos,
faz tudo mecanicamente. Sobe na cama para alcançar o armário, tira uns travesseiros
e os joga na cama, os olha e se recorda das guerras de almofadas que faziam de
madrugada, logo volta a si. Agora pegava alguns edredons que ficavam na parte
mais alta, esticasse ao máximo, e assim que tenta descer da cama, escorrega.
Stenio, porém, é mais rápido e a toma nos braços. Se olham fixadamente por
alguns instantes. Assustados, ofegantes, tristes, doídos, com medo...
S: Helô... – A segura cada vez mais firme e ela, sentido suas
mãos pelo corpo, vai ficando mole. – Eu acho que precisamos conversar... – Cola
seu nariz ao rosto dela, que logo dá um jeito de se afastar.
H: Ai, Stenio, me solta. – Recolhe os edredons que caíram no
chão e os joga por cima da cama. – Não temos nada para conversar, e não vem atrás
de mim não. Hoje tu dorme ai! – Aponta para a cama e se vai.
S: Aaaah não, Helô!! – Ele a segue e, quando chega a porta
do quarto de Helô, a vira bruscamente, trazendo-a para si. – Você vai me ouvir
sim! – Ela o olha espantada. – Todos esses anos me julgando sem deixar eu depor
a meu favor!!
H: Isso porque eu sou delegada e não juíza. - Ironiza
S: Não quero um decreto, delegada, quero uma chance de me
defender. Você não disse que todos têm direito de defesa, o que eu preciso
fazer pra você me ouvir agora?
H: Eu preciso de algo que só você pode me dar, Stenio... –
Se aproxima de seu rosto, o toca levemente com os dedos e dispara - Sua
ausência! Zarpa daqui! – Finalmente se soltam e ela bate a porta, o deixando do
lado de fora, sem reação, até que...
S: Você vai se arrepender, Helô. – Fala atrás da porta. –
Não é assim que se resolve as coisas. Não é assim que vencemos nossos medos. Covarde!
– Ele grita, indo para o outro quarto. – É isso que você é, covarde!
Heloisa se encosta a porta e desce, deslizando por ela, chorava
e não sabia mais o que sentir. Era como leu em um livro de Caio F. Abreu: “Procurou
um rótulo para pacificar o sentimento, mas não o encontrou”. Ela sabia que o
amava e que o medo desses sentimentos eram verossímeis, mas não podia falar
isso, não em voz alta...
No quarto ao lado...
O relógio marca meia noite, Stenio continua impaciente,
sentia que precisava falar naquele momento, não aguentaria até a manhã
seguinte. Ele a conhecia muito bem, cada centímetro de seu corpo, talvez até de
uma alma, sabia que era puro medo, insegurança e orgulho. Ele respira fundo e
se levanta da cama, rumo ao quarto dela...
Helô vira de um lado para o outro na cama, não conseguia
pregar o olho de modo algum, não sabia o que fazer, nem como fazer para sair
daquela situação. “De novo não!”, pensa ela, ao lembrar-se de Carmem, Débora,
Raquel... Nomes que rodeavam sua cabeça, deixando-a louca. “Ele não seria
capaz... Não novamente... Ou seria?”. Ela não suporta mais tantos pensamentos
lhe queimando a cabeça, fazendo dual a todo momento, transformando sua angustia
em medo, seu medo em desconfiança, sua desconfiança em fé, sua fé em raiva, sua
raiva em amor.... Amor que sentia por ele, e que jurava (secretamente) que
estaria a cima das outras coisas. Assim, se refaz em pulo e corre até a porta,
abrindo-a e dando de cara com ele.
H: Stenio... – Ofegante e sem voz, ela se assusta, mas
admite para si mesma que foi um dos melhores sustos que já tomara na vida...
Continua...
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